Velocidade
e segurança -
Uma análise
técnica sobre como se relacionam
Introdução
e primeiras considerações
Este
artigo tem por finalidade esclarecer aos interessados as considerações técnicas
relativas à velocidade e seu impacto na segurança viária. Em outra vertente,
tem a pretensão de oferecer uma perspectiva motociclística para as diversas
interações decorrentes do tema.
O
que é velocidade?
De
maneira bem simplista, para facilitar o entendimento, velocidade é a rapidez
com que um objeto se desloca em relação a uma referência. Esta última pode ser
uma referência fixa, como um ponto no solo, ou uma referência móvel, como outro
objeto também em movimento. O estudo de ambas as condições da velocidade de um
veículo é necessário, junto a outros parâmetros, para poder se avaliar como o
conjunto afeta a segurança viária.
É
um ABSURDO tentar atribuir apenas à velocidade máxima permitida em uma via, a redução
ou aumento de colisões de trânsito. Trata-se de falácia que não merece crédito,
e será desmontada ao longo deste texto.
Se
apenas a velocidade fosse o único parâmetro causador de incidentes, veríamos em
todas as competições à motor, uma infinidade de acidentes, já que nestas
competições a velocidade é exercida em seu máximo pelo maior tempo possível. Mas,
pelo contrário – em análises de acidentes em competições, pode se notar que apesar
da presença do fator velocidade, essa, tem peso irrelevante frente aos
elementos relacionados ao controle do veículo, bem como da interação do mesmo
com o meio onde opera. O mesmo exemplo também demonstra que a análise do meio
onde a velocidade é praticada é ABSOLUTAMENTE FUNDAMENTAL para justificar a
necessidade de aumento ou redução da velocidade máxima para as condições
analisadas.
Velocidade estática e
velocidade relativa
Em
princípio, toda velocidade medida deve possuir uma referência, podendo esta ser
estática ou em movimento. O conceito torna toda velocidade, portanto, relativa
ao seu referencial. Mas, para melhor compreensão, chamarei aqui as duas medidas
de: “velocidade estática”, referindo-me a velocidade marcada pelo velocímetro
de um veículo e que denota a rapidez com que se desloca em relação ao solo,
enquanto o termo “velocidade relativa”, eu usarei para denotar a velocidade
existente entre dois objetos em movimento. A importância dessa separação ficará
mais evidente com mais um simples exemplo:
Tomemos
por exemplo, dois carros de porte e capacidade semelhantes se deslocando em uma
avenida de sentido único, a uma velocidade constante de 80 Km/h. Enquanto suas
velocidades permanecerem inalteradas, NÃO HÁ COMO PRODUZIR UMA COLISÃO ENTRE
ELES. Para todos os efeitos, poderiam estar tanto a 50Km/h, quanto a 350Km/h.
Não há uma relação de aproximação ou afastamento entre os dois, e desta forma
não há condições necessárias para que um colida com o outro. Observem que estão
sendo analisados apenas os veículos em movimento, desprezando-se totalmente o
meio que os circunda, nesta etapa de elucidação do raciocínio.
Vejamos
agora o que acontece quando alteramos essa mesma condição e colocamos um dos
carros trafegando à 50 Km/h, enquanto o outro mantém os mesmos 80Km/h. Estando este
último atrás do carro mais lento, estará se aproximando do mesmo com uma
velocidade de 30 Km/h, e se estiver à sua frente, estará se afastando do carro mais
lento com a mesma velocidade, 30 Km/h. O risco de colisão agora existe,
(observadas outras condições para tal), enquanto o mais veloz estiver atrás do menos
veloz e, deixa de existir, se estiver à sua frente.
Agora
fica evidente a importância do estudo da velocidade relativa das diversas
categorias de veículos em um dado ambiente, pois a diferença nas velocidades
constitui risco à operação, quando o desejável é que as categorias possam
desenvolver o seu melhor, com pouca interferência uns dos outros, promovendo
assim um fluxo com poucas obstruções.
Segurança
viária
A
segurança viária é resultado da conjugação de diversos aspectos relacionados à
condução de um veículo, associados ao comportamento adotado por todos os
agentes que interagem nesse meio operacional. Vejamos alguns desses aspectos:
Relativos ao condutor
Qualificação
prévia, tempo de treinamento, experiência individual, qualidade do material
didático, empenho pessoal, estabilidade psicológica e outros.
Relativos ao veículo
Condições
e estado geral do veiculo, bem como a atualidade de sua manutenção.
Relativos ao meio
operacional
Condições
da via quanto à regularidade do pavimento, visibilidade geral, condição
meteorológica, sinalização horizontal e vertical, inibidores, tais como
radares, lombadas, etc.
Fica
evidente, mais uma vez, que muitos são os aspectos a serem considerados pela
autoridade pública responsável pelo trânsito, quando estabelece a velocidade
máxima de um trecho de via. Além dos aspectos já citados, a autoridade deve
considerar ainda a topografia, mudanças na velocidade de fluxo devido a curvas
ou outros obstáculos que requeiram mudanças na trajetória, entre muitos outros
aspectos que não cabem ser discutidos nesse momento. No entanto, fica patente a
necessidade de base técnica para se proceder com quaisquer mudanças ou
adequações na velocidade máxima que será permitida.
Da
mesma forma, não se pode imaginar que a autoridade competente se guiará
exclusivamente pelo parâmetro técnico, apesar de ser o desejável. Ela precisa
também tratar do assunto politicamente, objetivando um bem coletivo maior. No caso
em questão, o bem maior é o não estrangulamento das vias que podem ter um fluxo
maior e mais homogêneo.
Na
administração anterior em São Paulo, a redução de velocidade nas marginais
(vias de tráfego rápido, sem acesso de pedestres) promovida pelo prefeito
Haddad não seguiu critérios técnicos, mas tão somente os políticos. Pelo que
suas ações indicam, era seu desejo diminuir a velocidade nas marginais para
tentar compatibilizar vias de trânsito rápido, com segurança para o ciclista,
que por hora, goza de forte lobby junto às autoridades. Quando digo “indicam”,
me refiro a ausência de material técnico que subsidiasse a ideia de redução de
acidentes de trânsito, tida como bandeira para a promoção das reduções na
velocidade.
Foi
um erro técnico e político. Técnico, porque pretendia misturar à força,
ciclistas e agentes de trânsito muito mais rápidos e constantes que estes,
criando imenso risco de colisões devido ao aumento na velocidade relativa –
circunstância quando ciclistas dividem o mesmo meio operacional com carros,
motos, ônibus e caminhões. Um erro político, pois prejudicou o fluxo de
motoristas e motociclistas estrangulando o fluxo para agradar apenas aos
ciclistas.
Ainda
bem que a administração atual, de João Doria, não pensa da mesma forma e
corrigiu essa distorção de valores, onde se prejudica a maioria para favorecer
uma minoria.
À
saber: também sou ciclista e jamais andaria em uma via onde a maioria dos
objetos que me cercam é mais veloz, de maior massa e, o mais grave, incidindo
por trás, fora de meu ângulo de visão natural. Isso é se colocar completamente
à mercê de toda sorte de motoristas e motociclistas, sem que nada possa fazer
para garantir a minha segurança.
Pesquisas
e estatísticas
As
pesquisas referentes ao tema, bem como as estatísticas produzidas ao longo do
tempo, seriam fundamentais para as autoridades de trânsito, na elaboração de
políticas públicas, SE DE FATO EXISTISSEM.
DESAFIO
PUBLICAMENTE qualquer pessoa, autoridade ou não, a apresentar pesquisas
relativas ao trânsito que tenham sido registradas e, tenham sua metodologia
apresentada de forma transparente para comprovação. Mesmo as estatísticas produzidas
pelas autoridades de trânsito, não passam de mera coletânea de dados, sem
qualquer critério objetivo, podendo ser distorcidas para qualquer lado, segundo
aquele que as apresenta. Isto não pode ser considerado um trabalho de
qualidade, pois induz ao erro quem deve decidir sobre um determinado tema, sob
a ótica de política pública.
Afirmo
CATEGORICAMENTE que não há no Brasil qualquer estatística confiável sobre
acidentes de trânsito, pois as mesmas não coletam dados fundamentais para a
elucidação de uma determinada colisão, não podendo, portanto, imputar
responsabilidade a qualquer dos partícipes. Muito menos servem de baliza para
as autoridades, pois apresentam dados parciais e incompletos, dando margem a
erros grotescos.
Qualquer
dado apresentado, precisa ter o respaldo técnico quanto à metodologia usada
para coleta, tanto quanto, para os parâmetros a serem coletados para posterior
análise. Sem essas medidas, constituem uma base inócua, e tornam seus
resultados, meras especulações.
Velocidade
de fluxo
Para
entender o conceito, imagine um tubo de água com vários objetos de tamanhos e
pesos distintos, disposto na horizontal. Ao se promover o movimento da água em
qualquer sentido, observar-se-á que os maiores e mais pesados tenderão a se
mover mais vagarosamente que os menores e mais leves.
É
o que acontece também em nossas ruas, que transferem as pessoas de um lugar
para outro e assim determinam em dado momento uma velocidade mediana que pode
ser observada entre veículos pesados, veículos leves e motos. Notem que não
incluo ciclistas nem pedestres, pois em principio, deveriam estar segregados
desse meio, por não conseguirem atingir as médias horárias de velocidade praticadas
pelos outros agentes, conforme descrito acima.
O
que pode ser observado na instância dada como exemplo, é que os objetos mais
pesados, de maior volume, simbolizando os caminhões e ônibus, têm velocidades
reduzidas em relação aos demais porque tem sua capacidade de manobra limitada
por sua massa. Os carros, sendo menores e mais leves, constituem maior
capacidade de manobra. Aceleram e freiam com maior eficiência em relação aos
pesados, além de poderem mudar de direção com maior rapidez. É por essa razão
que se observam duas placas de sinalização de velocidade máxima, uma indicando
a velocidade permitida para o primeiro grupo, e outra, mais veloz, para o grupo
dos automóveis. Neste caso, o legislador está em conformidade com a necessidade
operacional de ambos.
A
moto e o trânsito
Seguindo
o mesmo raciocínio, as motos tem massa muito menor que a de um carro (cerca de
10% em média), capacidade de aceleração e frenagem superiores aos carros
(medianamente), capacidade de manobra muito superior, e, no entanto, não têm
reconhecidas pelas autoridades de trânsito, suas necessidades operacionais. São
rebaixadas em sua capacidade, ao que os automóveis podem fazer, sob a ótica da
legislação.
Não
pretendo aqui pleitear maiores velocidades para as motos, apesar de tecnicamente
a premissa estar correta, como demonstrado acima. Mais ainda, as motos de fato
se locomovem mais rápido que o trânsito à sua volta na maior parte do tempo,
demonstrando outra vez, que as leis da física estão acima das leis dos homens.
Seria justo, e tecnicamente correto, que os motociclistas tivessem permissão
para praticar as velocidades que de fato já praticam, mas sem o ônus de
desrespeitar a lei.
Lembro
ao leitor, que existem sim, maus motociclistas que desrespeitam a vida, a lei e
o bom senso – e lembro também, que o mesmo é verdade para motoristas, ciclistas
e pedestres. Dessa forma, peço a NÃO generalização dos grupos.
As
motos devem de fato ter essa condição de praticar velocidades maiores que o
fluxo para a própria segurança do motociclista, apesar de à primeira vista, o
conceito parecer antagônico. Explico:
Entre
dois veículos em condição de ultrapassagem um do outro, cabe a responsabilidade
sobre a ação, ao usuário do veículo que decidir por ultrapassar, sendo o outro
um agente passivo (em princípio), perante a ação. Quem executa a ultrapassagem,
determina com que velocidade será feita, à qual distância do outro veículo
ficará e, ainda, terá de prestar atenção ao que o outro motorista demonstra ter
entendido de sua ação. Essa é a dinâmica da interação típica em estradas de
pista simples, mas o conceito pode ser aplicado também para ultrapassagens em
vias de múltiplas pistas na mesma direção.
A
premissa da ultrapassagem, por ser o agente mais rápido do trânsito, serve ao
motociclista porque entre ele e um automóvel, ele é a parte mais frágil,
devendo reter para si a responsabilidade e a forma como a situação irá se
desenvolver.
Se
o motociclista é obrigado por lei a seguir as mesmas velocidades autorizadas
aos carros, estará em constante relação de proximidade com veículos muito mais
pesados que o seu, que tem menor manobrabilidade, possuem restrições visuais e
frequentemente estão sendo operados por pessoas despreparadas e desrespeitosas.
Para
melhor compreensão do que passa o motociclista, convido o leitor motorista de
carro a tentar praticar em diversas situações, as mesmas velocidades de um ônibus
ou caminhão, exercendo a mesma relação de proximidade. Assim ficará mais do que
evidente que as velocidades entre carros, motos e veículos pesados são
diferentes, e é assim que deve ser, para que haja fluxo nas vias da cidade.
Antes
que me crucifiquem, quando digo “velocidade máxima maior que a dos carros”,
refiro-me a velocidades não superiores a 15 Km/h acima das velocidades
praticadas pelos veículos leves. Apenas o suficiente para que possam executar
as ultrapassagens de maneira a serem vistos e entendidos no trânsito.
Entendo
que maiores velocidades para um grupo de pessoas que não estão devidamente
preparadas para arcar com as responsabilidades de serem os agentes mais rápidos
do trânsito, não deve ter respaldo do poder público, que é quem decide a
questão. Mesmo que esse grupo de pessoas some milhões, apenas na cidade de São
Paulo. Mas, insisto que o exposto, pode ser demonstrado cientificamente, tendo
assim, valor técnico.
Conclusões
É
ingenuidade pensar que as colisões entre veículos, ou contra obstáculos, possam
ser extintas. Basta observar todos os países do mundo, para ver que as colisões
acontecem no mundo todo. Sem exceções. Em alguns lugares mais que em outros,
mas em todos os lugares.
O
que nos resta então é achar maneiras inteligentes de diminuir esses números o
máximo possível, e isso, só se obtêm com preparo mais adequado de quem opera
essas máquinas, com poder publico ciente de sua responsabilidade em atender TODOS
os componentes do trânsito e fiscalização adequada, apropriada, justa.
Espero
que a administração de João Doria na cidade de São Paulo ponha fim à esse
tenebroso inverno que todos nós, motociclistas, vivemos há décadas. Está mais
que na hora de deixarmos de fazer parte do problema, para sermos parte da
solução.
Nenad
Djordjevic
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente com sua conta do Google