sexta-feira, 19 de agosto de 2011

A curva perfeita


Planejamento e método são fundamentais para se obter o melhor nível de segurança em curva

As curvas para um motociclista são – para a maioria de nós – a expressão máxima do domínio do piloto sobre a máquina. Não é a toa que o processo de inclinação associado, exerça tanta fascinação por parte de usuários e aficcionados. A beleza plástica é no mínimo impar.
Estética à parte, do ponto de vista técnico, é necessário um raciocínio claro e metódico para definir os parâmetros que possam ilustrar – mesmo que utopicamente – a curva perfeita.

Primeiramente, é preciso definir o contexto à ser trabalhado, uma vez que impacta diretamente sobre a técnica que será utilizada. A abordagem mais enfática será, obviamente, voltada para a segurança cotidiana do motociclista, mas para efeito de comparação, serão também abordadas as curvas de máximo desempenho – como as feitas em contexto esportivo.

Definindo elementos
Ao contrário da crença da maioria de que a execução de toda curva é composta de três fases – entrada, meio e saída – todas as curvas executadas por um motociclista são compostas de quatro fases, incluindo-se na lista anterior, a fase de aproximação, como sendo a primeira delas. Veja agora como cada fase se processa:

  1. Aproximação: Ela se inicia no momento em que o piloto visualmente detecta uma curva em seu caminho; Passa a analisar as informações que coleta, para poder promover uma mudança de estado da moto que seja pertinente ao que pretende realizar durante a curva. Os elementos coletados serão julgados e comparados ao estado em que a moto se encontra para definição de como se adequar ao que está por vir. Pode implicar em mudança de velocidade, marcha utilizada, postura corporal e outros elementos. A fase se conclui com o início da seguinte.
  2. Tomada da curva: O início da tomada, propriamente dito, se dá quando se inicia o processo de inclinação da moto, e a fase é concluida, quando se atinge a inclinação desejada, estabilizando a moto nessa configuração inclinada.
  3. Meio ou tangente: A fase do meio da curva se estende desde a estabilização da moto inclinada, até o momento onde se pretende voltar à vertical. Dependendo da extensão do raio da curva, essa fase pode durar desde décimos de segundo à vários segundos.
  4. Saída da curva: Essa fase é caracterizada a pertir do momento que se inicia o retorno à vertical, concluindo-a quando a moto volta em definitivo para a posição vertical.
Como pode ser visto, a fase de aproximação é a fase mais importante da curva porque é quando serão tomadas as decisões de como ela será realizada, sendo as outras três fases de mera execução do que foi planejado.

Configurando a moto
Utiliza-se a fase de aproximação para configurar a moto para o estado seguinte, onde estará executando a curva.
São quatro os principais parâmetros de configuração de uma moto para esse  processo – a adequação da velocidade através de processo de frenagem ou aceleração, a quantidade de inclinação desejada, aceleração pretendida e a rotação do motor através da marcha escolhida.
A curva ideal – do ponto de vista da segurança – deve ser executada privilegiando maiores opções para o usuário, enquanto a limitação dessas, impacta negativamente em sua segurança.
O ajuste da velocidade deve ter como premissa o entendimento de que opções são geradas enquanto há tempo para promover ações diferentes das inicialmente planejadas. O motociclista mediano necessita de no mínimo dois segundos para interpretar uma situação e produzir uma ação defensiva, portanto, a distância mínima de visão dentro da curva deve compreender esses dois segundos – mas quanto mais tempo, melhor. Isso significa que, se um obstáculo entrar no campo de visão do motociclista em curva, ele terá tempo suficiente para se adequar e não colidir com ele. Trata-se, claramente, de curvas que não possuem total visão de sua extensão, tendo assim o piloto, uma ferramenta para mediar sua velocidade em função de suas capacidades reacionais.
Junto com a mudança na velocidade, virá a necessidade de adequação das rotações do motor, escolhendo a marcha mais pertinente. A marcha selecionada deve promover rotações medianas do motor. Nesse estado, permite tanto aceleração quanto desaceleração durante a curva, caso alguma necessidade se faça presente. Se a rotação estiver perto de seu limite, como quando a utilização da moto é esportiva, apenas sobra ao piloto a desaceleração como forma primária de ajuste, uma vez que maior aceleração implicaria em necessidade de mudança de marcha. Um motor em marcha mais "solta" também é mais dócil para controlar no punho do acelerador, enquanto que perto do seu limite máximo de giro, estará também gerando o máximo de sua potência e torque, tornando a manipulação da manopla bastante crítica.
A aceleração pretendida durante a curva deve ser nula – mantendo-se a velocidade inicial da curva, obtem-se o melhor apoio das duas rodas e pneus com o solo. Estando em processo de aceleração, a roda traseira passa a ter maior carga, enquanto que em desaceleração, é a roda dianteira que recebe essa carga maior. Esse é o aspecto mais dificil de satisfazer durante a curva porque a grande maioria delas é afetada pela topografia – somente as curvas em plano horizontal permitem tal ajuste, enquanto as subidas exigem maior aceleração e as descidas, menor.
Por fim, a inclinação – o ideal para a segurança é tentar obter uma inclinação mediana da moto em relação a sua capacidade total de se inclinar. Vale lembrar que a inclinação máxima se dá quando um terceiro ponto de apoio é criado contra o solo. Os outros dois são os pneus dianteiro e traseiro. Geralmente esse ponto é alguma extremidade lateral, sendo o mais comum a pedaleira. Essa é a razão para a grande maioria das motos terem essas peças montadas de forma dobrável – para não oferecerem um contato rígido contra o solo. Tendo-se então a percepção de qual é o máximo que sua moto se inclina, pode-se determinar o que seria uma inclinação mediana – aquela entre a máxima e a posição vertical da moto. Mais uma vez, a razão reside na necessidade de se criar opções, tanto para fechamento, quanto para abertura do raio da curva, se necessário for. Estando-se em uma curva de máximo desempenho – como em situação desportiva – busca-se se exatamente esse limite de inclinação para maior desempenho, mas com isso, limitam-se as opções quanto a imprevistos.

Conclue-se então, que a curva perfeita, ou ideal, é a que é tomada com o máximo de disponibilidade de opções, oferecendo ao motociclista uma ampla gama de possíveis soluções para alguma adversidade. Uma atitude ponderada, calma, com folgas para imprevistos, é o principal ingrediente no processo de tomada de decisão. Buscar inclinação mediana com rotações medianas, aceleração neutra e velocidade compativel com sua capacidade de reagir a eventos inesperados, constitúi a base de uma curva tomada racionalmente.

Teste sua percepção
O teste à seguir, tem como propósito ilustrar como processamos de forma intuitiva uma série de informações dignas de análise bem mais profunda que a que normalmente disponibilizamos para cada curva que fazemos.
Imagine-se em uma estrada qualquer, prestes a fazer uma curva qualquer. Tente enumerar todos os parâmetros que influenciam sua decisão de como irá tomar a curva que se aproxima. Quais são os elementos que farão com que acelere, freie ou troque de marcha, para se adequar ao que a curva comporta?
Se não pensou em todos os elementos descritos na resposta, significa que processa essas informações de forma sub-consciente, podendo em algum momento subjulgar  um dado que pode ser crucial para a conclusão da curva. Experimente!





Resposta à questão formulada:
Esses são os dados que todos nós processamos, na análise de adequação de toda e qualquer curva.
  1. Curva conhecida ou desconhecida?
  2. Raio – de baixa, média ou alta velocidade?
  3. Raio – constante, crescente ou decrescente?
  4. Plano – curva em nível, ascendente, descendente ou combinção dos elementos?
  5. Inclinação lateral da estrada – neutra, compensada ou descompensada?
  6. Visão da extensão de seu raio – com ou sem visão?
  7. Pavimento – regular ou irregular?
  8. Meio – dados fornecidos pelo meio, como sinalização horizontal e vertical; comportamento de outros veículos
  9. Estado da moto – conservação, desgaste de freios, pneus, etc.

5 comentários:

  1. Interessante kara... mas aeh, existem um PQueno detalhe sobre "aceleração pretendida ser nula". Na verdade existe uma PQuena manha de soltar a aceleração e puxa-la novamente, isso ajuda a estabilizar em caso de a curva ser muito forçada, PQuenos retoques equilibram a total estabilidade da moto ^^ ((Belo post, agradeço))

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  2. Se ler atentamente, verá que o objetivo desse procedimento é a segurança, e não o desempenho em curva. Para essa outra instância, existe um conjunto de regras específico, que não foi tratado nessa matéria.
    Não há propósito em acelerar e deixar de acelerar na curva uma vez que mexe com o centro de gravidade de um objeto que se quer manter estável. Em termos de estabilidade, "retoques" não deveriam ser produzidos, apesar disso ser difícil de conseguir na condução diária devido a outros fatores involvidos.

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  3. Nenad,tenho uma srad e acho que ela balança muito nas curvas e nas esticadas,tenho cerca de 80kg e gostaria de regular a suspensão...Como devo proceder..Abraçao

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  4. Diogo,
    São vários os aspectos que podem provocar esse tipo de comportamento. Vão desde estado e calibragem de pneus até a regulagem da suspensão, como você disse. Tem de se levar em conta o meio operacional, pois cada lugar exige setup diferenciado para atender as condições do momento. De qualquer forma, a suspensão é o último ítem a se mexer, e o mais complicado, pois a frente afeta o comportamento da traseira e vice-versa.
    Sugiro que comece por acertar a suspensão em seu estado original, ou seja, mediano para todas as regulagens. Esse é o ponto de partida. Investigue pneus, como foi dito, folga da caixa de direção e se ainda estiver com o mesmo problema, deve ser investigada a forma de pilotar. Postura corporal, movimentos excessivamente bruscos no acelerador são apenas alguns dos aspectos que tem de ser avaliados. Só a partir daí iria mexer em regulagem de suspensão. Abrtaço!

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  5. No caso de "aceleração Nula" se eu estou em 9.000rpm e simplesmente solto o acelerador o peso da moto vai para frente, isso não prejudicaria a estabilidade ? Ou devo manter os 9.000rpm e entrar acelerando igualmente na curva ?

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