segunda-feira, 23 de junho de 2008

Pilotando na estrada


Conheça dicas para uma pilotagem mais segura e eficiente em estradas.

É muito prazeroso poder desfrutar de uma moto na estrada. O sentimento “easy rider” imediatamente nos invade e tudo a nossa volta parece ficar mais colorido, iluminado, não é mesmo? Precisamos tomar certo cuidado para não permitir que esses sentimentos positivos ofusquem o bom senso e se transformem em negligência ao meio. Não se engane: o meio que enfrentamos é absolutamente hostil, apesar de sua aparência quase sempre pacífica. Está sempre pronto a nos cobrar caro, qualquer descuido ou falta de atenção.
O cenário à nossa volta está em constante mutação, mas tendemos a interpretá-lo como sendo imutável, principalmente quando estamos em um ambiente em que já estivemos anteriormente. Isso acontece porque “mapeamos” todos os parâmetros e erroneamente acabamos julgando que todos eles são constantes, enquanto a verdade é que poucos o são.
Para sermos eficientes, e com isso gerarmos segurança, devemos entender quais os elementos que constituem o trinômio que pode promover essas condições. Pra começar, é preciso ter ótimo conhecimento do que a moto é capaz de produzir como desempenho – saber de sua capacidade de curva, aceleração, frenagem, aptidão para mudança de direção, e assim por diante. Também é necessário ter ciência de suas próprias capacidades e limitações como piloto, e se policiar para tentar elevar esse conhecimento apenas em ambientes onde algum controle possa ser exercido – focando essa atividade. Por fim é preciso conhecer o lugar aonde acontece a interação, tomando o cuidado para não cometer o erro de julgamento descrito acima. Se o tratarmos como desconhecido, estaremos prestando maior atenção, e assim, diminuindo o risco.
Uma das atividades na estrada com alto potencial de risco é a curva. Vejamos qual a melhor abordagem para ela:

A curva perfeita
Freqüentemente perguntam em meu curso qual é a velocidade correta para se executar uma curva. A equação que responde essa pergunta está ligada ao princípio de que devemos nos locomover com tal velocidade, que permita identificar um obstáculo, processar essa informação e executar uma ação defensiva em tempo apropriado. Mais à frente, veremos como quantificar isso, mas antes vejamos outras necessidades:
É necessário configurar a moto para que desempenhe de maneira a oferecer a maior amplitude possível de recursos. É preciso entender que cada moto tem seu próprio desempenho em relação à curva, porém ainda assim, é possível identificar os aspectos que definem a gama de opções existente para todas.
Um dos parâmetros que deve ser observado é a inclinação. Sabendo que a inclinação máxima de uma moto se dá quando outro ponto além de seus pneus entra em contato com o solo, é desejável buscar uma inclinação mediana, que ofereça a possibilidade de tanto inclinar mais quanto menos. Estando em inclinação máxima em uma curva, apenas sobra a possibilidade de retorno à vertical – significando a abertura do raio. Na maioria das situações em uma estrada, isso representa grande potencial de risco.
Outro aspecto a ser observado é a aceleração. Sempre que possível, deve-se estabelecer tal velocidade em curva, que se possa manter a aceleração constante. Ou seja, sem variação para cima ou para baixo. Tanto a aceleração quanto a desaceleração promovem um movimento do centro de gravidade, posicionando-o para frente e para trás, carregando assim maior peso em uma roda do que na outra. Quanto melhor a distribuição de energia, melhor é o equilíbrio, gerando capacitação e confiança para execução do que for necessário.
Essa aceleração constante, por sua vez, pede que a marcha utilizada possa promover rotações que garantam o máximo de amplitude de uso do motor, colocando a segurança acima do desempenho. As rotações ideais para a situação de estrada, também são medianas, ou seja, garantindo a possibilidade de aceleração, bem como desaceleração. Essa medida contraria àqueles que dizem que se deve entrar em curvas com o motor “cheio”, próximo ao limite máximo de rotações. Essa afirmação só tem validade quando o meio é uma pista de corridas, onde sim, o máximo de desempenho é desejado – e também esperado – mas absolutamente incoerente para uma estrada, onde o ideal é a busca da segurança. Ao adotar uma marcha que permite uma moto mais “solta” na curva, um benefício extra é gerado pelo piloto, através da maior amplitude de erro na manipulação do acelerador, que a ação possibilita. Pequenas mudanças na aceleração não promoveriam grandes movimentos do centro de gravidade – o que certamente ocorreria com os giros próximos à faixa de maior potência, beirando o limite máximo das rotações.
Por fim, um dos mais importantes aspectos dessa equação é a visão – o quanto do que está à frente pode ser visto. Como dito no início, só podemos imprimir velocidade em curva, proporcionalmente a distância que temos dos possíveis obstáculos. Veja como se aplica:


Regra dos “dois segundos”
Um estudo norte-americano feito no fim da década de 50 demonstrou que o condutor médio necessita de aproximadamente 1,6 segundos para reagir a um evento inesperado. Esse seria o tempo necessário para interpretar uma situação e produzir uma ação satisfatória. Criou-se a partir daí a regra dos “dois segundos” – se estivermos a uma distância de dois segundos de um obstáculo, em principio estaremos em condições de reagir de maneira apropriada para evitar uma colisão.
A distância é quantificada em tempo porque a distância física está relacionada à velocidade de deslocamento. A 60 Km/h, esses dois segundos representam aproximadamente 33 metros, enquanto a 120 Km/h, representam o dobro. Essa regra simples permite que criemos o distanciamento apropriado de todos os objetos que podem constituir risco, estando eles fixos ou móveis. Vejamos um exemplo: Imagine estar em uma curva em estrada de pista simples, e que a extensão total da curva não possa ser estabelecida por conta de obstruções visuais, como mato por exemplo. Ao olharmos para o ponto mais longínquo dentro da curva, podemos usar um objeto qualquer como referência para determinar se a velocidade é apropriada. Pode ser uma árvore, placa ou outro qualquer. Se contarmos mentalmente esses dois segundos e passarmos então ao lado dessa referência, estaremos em velocidade apropriada, enquanto que se passássemos antes do término da contagem, estaríamos mais velozes do que o adequado. Dessa forma, qualquer objeto que entre no nosso campo visual pode ser tratado de forma segura, pois foi criado o tempo necessário para lidar com ele, através da adequação da velocidade.

Ritmo
Nosso corpo, mente e visão precisam de certo tempo para se ambientar a velocidade impressa em estradas. Dê tempo para que esse ajuste possa ocorrer, imprimindo maiores velocidades gradualmente. Não permita que a beleza do cenário tire sua atenção da tarefa da pilotagem.
A adoção dos parâmetros que controlam a velocidade em curva e a aplicação da regra dos “dois segundos” permitem que um ritmo estável e confortável seja atingido. Já para as retas, é preciso determinar o compasso que a maioria adota, e se adequar a ele, visando uma interação pró - ativa. Lembre-se que uma moto na maioria dos casos se locomove com maior destreza que os veículos à sua volta, e dessa forma coloca-se em condições de ultrapassagem com freqüência. Adote sempre velocidades de ultrapassagem que condizem com a situação, oferecendo entendimento aos demais de suas intenções.
Um bom ritmo na estrada cansa muito menos do que trechos lentos e velozes se alternando. Boa viagem e divirta-se!

9 comentários:

  1. Por varias vezes ja tinha ouvido falar que as curvas nas serras teriam que ser feitas como motor cheio...aprendi mais uma nessa materia.Parabens.

    Claudio Simões

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  2. Pois é Claudio,
    como disse na matéria, é bastante comum ouvir esse comentário, mas quase ninguem é capaz de explicar porque.
    Esse comportamento só tem validade em um ambiente de competição, onde tem respaldo lógico de porque ser aplicado, mas em condições de estrada do dia-a-dia, não tem justificativa.
    Obrigado pelo apoio!

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  3. Gostei muito dessas dicas para a estrada. Na verdade, o seu blog é muito bom. Nos ensina a ter segurança na pilotagem. Parabéns!

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  4. Nenad e no caso de descida, de um serra com bastante declínio. Melhor descer na rotação mediana ou nas entradas de curvas da uma reduzida, te pergunto pois estava descendo na rotação mediana e sempre freio nesta ordem traseiro e o dianteiro, sendo que dessa vez o traseiro travou, quase me levando ao tombo pois a traseira da moto ficou do meu lado e perdi totalmente a tangência da curva, pois já estava me preparando para entra na curva. Outra dúvida, melhor fazer curva somente no contra-esterço ou contra- esterço e mais pêndulo(colocar a bunda um pouco pra fora)meu caso.
    Abraço.
    Daniel.

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  5. Nenad, completando tenho uma bandit 650s.

    Abraço

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  6. Cada situação exige uma ação distinta Daniel.
    Via de regra, em descidas se usa marchas reduzidas como forma de promover a desaceleração sem ter que recorrer aos freios. Isso não teve qualquer papel no seu episódio onde houve ao que tudo indica, uma pressão excessiva no uso do traseiro, ocorrendo o travamento. Mas para que tivesse quase caído em função disso, indica que a situação exigia já a utilização do freio dianteiro, pois a velocidade para que haja esse tipo de desestabilização tem que ser significativa.
    Quanto ao uso do pêndulo para auxiliar na curva, é válido quando se está em um ambiente apropriado como uma pista de corrida. Na estrada, a postura somente deve ser adotada se operacionalmente necessário em função de imprevistos, não como uma opção intencional.
    Abraço!

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  7. pergunta:pilotar na curvas das estradas inclinado para frente com visão acima da bolha e pernas coladas no tanque e correto?
    comentario:tive uma cbr 1000rr fireblade 2005 e tinha ela na mão tinha uma segurança nas curvas tremenda, agora comprei uma mv agusta f4 2007 e nao tenho ela com tinha a cbr ela, no minimo de movimento nas curvas ela que voltar para vertical. qual a dica que vc pode me dar?

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    Respostas
    1. A postura que descreveu é tipicamente usada para velocidade em reta, e não é apropriada para as curvas porque limita a visão. Quanto ao equilíbrio, cada moto tem seu conjunto de características que determinam seu comportamento. A CBR é uma das mais dóceis e equilibradas, enquanto a F4 pode dar trabalho devido as características racing que possui. Me parece pelo descrito que ainda tem alguma dificuldade com o contra-esterço, o que explicaria seu comentário a respeito da volta a vertical. Qualquer moto que tiver a ação no guidão aliviada durante a curva vai tender à vertical. Abs!

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  8. Nenad, eu tenho uma Honda NC 700Xa, essa no meio do caminho que não é naked e nem big trail (acho q ela não é big trail pq eu não arriscaria andar em terrenos irregulares com ela). Ainda tenho medo de fazer curvas com uma inclinação maior nela. Sempre reduzo mto antes das curvas para não ter que inclinar mto, com medo dela escorregar (deve ser neura). Visto que ela tem pneus razoavelmente largos, específicos para asfalto, ela aceitaria uma inclinação como se eu estivesse numa esportiva?

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